As barcas, os carros e suas alegorias

No segundo domingo de outubro, as ruas da cidade de Belém ganham um colorido diferenciado, especialmente pela quadra nazarena. No meio de toda a composição estão presentes, os carros e barcas que alegoricamente preparadas, ocupam lugar de destaque. Estes símbolos servem como elementos representativos da grandeza do Círio de Nossa Senhora de Nazaré. A maneira como as ruas vão ganhando cores diferentes, demonstram a importância desses elementos para a festa. Ao todo são 13 os carros/ barcas, os quais seguem a seguinte ordem na procissão:

Carro de Plácido (2000), Barca dos Escoteiros (também chamada de barca da Guarda Mirim), Barca Nova, Carro dos Anjos 1, Cesto de Promessas, Carro dos Anjos 2, Barca com Velas (1982), Carro dos Anjos 3, Barca Portuguesa, Carro dos Anjos 4, Barca com Remos, Carro Dom Fuas (1803) e Carro da Santíssima Trindade, substituído pelo da Sagrada Família (2017). Os carros de milagres são conduzidos por alunos de escolas públicas e privadas de Belém. Já os carros dos anjos são conduzidos por voluntários. Dois carros dos anjos são em homenagem ao Anjo Custódio (anjo da Guarda) e do anjo do Brasil que simboliza a nação brasileira (IPHAN, 2006, p. 35).

Cada um com sua alegoria diferenciada, representando as diversas situações que conduziram ao processo de criação do mito em torno do Círio. A introdução desses carros e barcas datam do século XIX; o primeiro carro, datado de 1855, recebeu a denominação de Brigue São João Batista. A introdução dessa barca ocorreu em virtude de uma promessa feita pelos marinheiros que teriam sido salvos de um naufrágio.

Carregadas de sentido simbólico, as barcas apresentam características que as ligam as águas, em decorrência do fato de Nossa Senhora de Nazaré ser considerada a protetora dos que viajam pelas águas, ressaltando ainda, a conexão entre as alegorias e a região, cercada, portanto, de rios.

Ainda segundo os relatos históricos, o carro dedicado a Dom Fuas Roupinho foi introduzido pelo presidente da Província, o Conde dos Arcos, Dom Marcos Antônio de Brito, em atendimento ao pedido de Dona Maria I, rainha de Portugal. Os demais foram introduzidos ao longo dos séculos XX e XXI, atendendo as demandas dos novos tempos.

Vale ressaltar o relato publicado no jornal Estado do Pará, de 09/10/1921, sobre o Círio de Nazaré, ao destacar: desde a madrugada a população começou a movimentar-se, descendo dos “arrabaldes” pelas ruas e avenidas até o largo da Sé. Rompia o préstito a banda de música dos artífices, seguida de uma multidão, na maioria levando o seu milagre para depositar na ermida. Seguiam-se, após:

O carro dos fogos, um piquete do corpo de cavalaria, carro dos bombeiros voluntários, o escaler histórico do brigue “S. João Batista”, repleto de crianças e carregado pelo povo; os botes “Chiquinha”, “Faceira”, “Rainha dos Anjos”, “Deus te Salve” e outros, também repletos de crianças e carregados pelo povo; diversos anjos montados em cavalos belamente ajaezados, carro dos milagres, a transbordar de figuras de cera, - demonstrativos dos milagres operados pela intervenção da Virgem; marujos, dançando como se estivessem em mar agitado; belo carro conduzindo grande número de meninas vestidas de anjo.

Essas nomenclaturas dadas aos carros ganharam novas significações e passaram a atender a dinâmica estabelecida pela diretoria da festa. Esta tem dado uma nova dinâmica quanto ao deslocamento dos carros para a área da Companhia Docas do Pará. Antes eram conduzidos até o lugar, ficando guardados até o domingo do Círio. No entanto, nos últimos anos, no dia do transporte desses símbolos, é organizado na frente da Basílica Santuário uma exposição, para que a população tenha um contato maior com esses elementos simbólicos. À noite, exatamente as 21h, são conduzidos, em uma mini romaria, que tem reunido um considerável número de pessoas (cerca de 3 mil). E ao longo das ruas por onde os carros passam, as pessoas aguardam ansiosas, “sentido a presença de Nossa Senhora de Nazaré”, conforme relatos dos fiéis.